sábado, 18 de maio de 2013

O PROFISSIONAL REFLEXIVO



                                      
                                                       Marli Sarcinelli Capp
                 Resumo:
        O objetivo deste estudo é fazer uma reflexão sobre a visão que os educadores têm do conhecimento profissional, que ainda é visto como a transferência de informação e a aprendizagem, como armazenamento dessas informações. A resistência do sistema educacional em aceitar a nova realidade, em que a ideologia, valores e ética tradicionais precisam ser revistos é muito forte. Já se tonou unanimidade a questão da inadequação do ensino, em seus diversos níveis, ante as necessidades de trabalho. Também tem sido objeto de constante questionamento a qualidade do Ensino Superior. Com a globalização da economia, a universalização dos bens culturais , o advento das novas tecnologias, a formação do profissional  competente e dinâmico para o mercado do absoluto, não poderá mais ser pensada nos modelos  tradicionais. Sabe-se também que, em decorrência desses fatores, uma profunda mudança das pesquisas em formação inicial e continuada está ocorrendo, quer seja de ordem política, pedagógica ou institucional. Inclui-se aí, o modelo ideológico, o tipo de conteúdo curricular e a sua falta de proporcionalidade com o conhecimento, diante de tantas e tão rápidas mudanças no mundo do trabalho.
         Tratando dessa dicotomia, Schön afirma que o currículo normativo das escolas, acaba por excluir a possibilidade de aplicação de um ensino prático reflexivo. Quanto o autor emprega o termo profissional, ele o faz envolvendo todas as profissões. Daí sentir-se a necessidade de um estudo mais voltado para a área da educação o que se foi buscar em Perrenoud, que trata  especificamente da prática reflexiva no ofício de professor. No decorrer deste estudo pôde-se também comprovar que a prática reflexiva pode e deve ser usada na Educação à Distância, onde há necessidade de se intensificar a interação professor x aluno e aluno x aluno dado às peculiaridades da clientela e também do domínio da tecnologia.

       Palavras-chave: reflexão, conhecimento profissional, currículo, resistência.

                  Abordando a crise de confiança no conhecimento profissional Schön faz uma comparação: compara a prática profissional, que não atende às necessidades da sociedade e dos alunos, com uma prática comprometida no atendimento dessas necessidades. 

      Na topografia irregular da prática profissional, há um terreno alto e firme, de onde se pode ver um pântano. No plano mais elevado, problemas possíveis de serem administrados prestam-se a soluções através da aplicação de teorias e técnicas baseadas em pesquisa. Na parte mais baixa, pantanosa, problemas caóticos e confusos desafiam as soluções técnicas. A ironia dessa situação é o fato de que os problemas do plano elevado tendem a ser relativamente pouco importantes para os indivíduos ou o conjunto da sociedade, ainda que seu interesse técnico possa ser muito grande, enquanto no pântano estão os problemas de interesse humano. O profissional deve fazer suas escolhas. Ele permanecerá no alto, onde pode resolver problemas relativamente pouco importantes, de acordo com padrões de rigor estabelecidos, ou descerá ao pântano dos problemas importantes e da investigação. Não rigorosa ?

         O dilema abordado por ele tem duas origens:
1ª- A ideia de um conhecimento profissional rigoroso, baseado na racionalidade técnica.
2ª-A consciência de zonas de prática pantanosas e indeterminadas, que estão além daquele, conhecimento.
         Para ele os verdadeiros profissionais são aqueles que solucionam problemas instrumentais, selecionando os meios técnicos mais apropriados-profissionais que solucionam problemas instrumentais claros, através da aplicação da teoria e da técnica derivadas do conhecimento sistemático, de preferência científico.
         Para exemplificar, o que pretende dizer, o autor afirma que nos últimos anos, o problema da prática do mundo real não se apresenta aos profissionais com estruturas bem-delineadas. Eles tendem a não se apresentar como problemas, mas na forma de estruturas caóticas e indeterminadas. Ele cita o fato de que engenheiros civis, que sabem como construir estradas adequadas a certos lugares e especificações, que se valem de aclives, declives, conhecimento do solo, materiais e tecnologias de construção, etc. Mas quando é necessário decidir qual estrada construir, o problema não é passível de solução só pela aplicação do conhecimento técnico, nem mesmo pelas técnicas sofisticadas das teorias da decisão. Eles enfrentam uma mistura complexa e mal definida de fatores: topográficos; financeiros; econômicos; ambientais e políticos. Se quiserem obter um problema bem-formado, adequado às teorias e às técnicas que lhe são familiares, eles devem construí-lo a partir dos materiais de uma situação, que é problemática. E o problema da definição de problemas não é bem definido.
      Quando um profissional define um problema, ele escolhe e nomeia os aspectos que irá observar. Ao construir estradas, o engenheiro civil pode observar a drenagem, a estabilidade do solo e a facilidade de manutenção, sem observar os efeitos diferenciais que essa estrada terá nas economias das cidades que estão ao longo de seu percurso.
     Através de atos complementares, o profissional seleciona fatos aos quais deverá se ater e os organiza guiado por uma apreciação da situação, que dá a ela coerência e estabelece uma direção para a ação. E assim ele exemplifica outras situações com agrônomos, epidemiologistas, nutricionistas, etc.
          É importante ainda lembrar que às vezes uma situação problemática apresenta-se como um caso único. Uma médica reconhece um conjunto de sintomas, mas não consegue associá-los a nenhuma doença conhecida.
        Uma professora de matemática, ao ouvir a pergunta e uma criança, conscientiza-se do tipo de confusão mental que está ocorrendo e, ao mesmo tempo, de um tipo de compreensão intuitiva para a qual ela não tem qualquer resposta disponível. É porque o caso único transcende as categorias da teoria e da técnica existentes. O profissional não pode tratá-lo como um problema instrumental a ser resolvido pela aplicação de uma das regras do seu estoque de conhecimento profissional.
        Schön vê um distanciamento da teoria e da prática, onde e privilegia o saber acadêmico em detrimento do saber prático.                    É preciso pensar uma nova epistemologia da prática e relevar a formação de um profissional reflexivo, refletindo justamente sobre a formação inicial deste.

A CRISE DE CONFIANÇA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

         A crise de confiança no conhecimento profissional corresponde a uma crise semelhante na educação profissional. Se as profissões especializadas são acusadas de ineficácia e inadequação, suas escolas são acusadas de não conseguir ensinar os rudimentos da prática ética e efetiva. Juízes criticam que advogados não são bons no que fazem.
          As faculdades de educação são as mais criticadas. Uns culpam os outros. E assim por diante. Por trás de tais críticas, está uma versão do dilema entre o rigor e a relevância. O que aos alunos mais precisam aprender, as escolas profissionais parecem menos capazes de ensinar. E a versão das escolas do dilema está enraizada, como a dos profissionais, em uma epistemologia da prática profissional pouco estudada- um modelo de conhecimento profissional implantado em níveis institucionais nos currículos e nos arranjos para a pesquisa e para a prática. As escolas profissionais da universidade moderna, dedicada à pesquisa, estão baseadas na racionalidade técnica.
                                                         Seu currículo normativo adotado inicialmente nas primeiras décadas do século XX , quando as profissões especializadas buscavam ganhar prestígio, através do estabelecimento de suas escolas em universidades, ainda incorpora a ideia de que a competência prática torna-se profissional, quando seu instrumental de solução de problemas é baseado no conhecimento sistemático, de preferência científico. (Schön 2002)
           Assim o currículo profissional normativo apresenta em primeiro lugar, a ciência básica relevante, em seguida, a ciência aplicada relevante e, finalmente, um espaço de ensino prático no qual se espera que os estudantes aprendam a aplicar o conhecimento baseado na pesquisa aos problemas da prática cotidiana.
VIRANDO O PROBLEMA DE CABEÇA PARA BAIXO
           “É impressionante o fato de que o desconforto em torno do conhecimento profissional persista, mesmo que alguns profissionais tenham excelente desempenho em zona indeterminadas, cuja importância está aprendendo a reconhecer.” Há profissionais muito competentes em suas áreas, mas o autor considera como “perspicácia”, “intuição”,” talento artístico” alegando que a questão do relacionamento entre competência profissional e conhecimento profissional precisa ser virada de cabeça para baixo. Isso é revista.
A perspectiva da obra de Schön começa com as seguintes premissas:
- Há um núcleo central de “talento artístico” inerente á prática dos profissionais que reconhecemos como os mais competentes.
-O talento artístico é um exercício de inteligência, uma forma de saber, embora possa ser diferente em aspectos cruciais de nosso modelo- padrão de conhecimento profissional. Ele não é inerentemente misterioso, é rigoroso em seus próprios termos, e podemos aprender muito sobre ele – dento de que limites devemos trata-los como uma questão aberta.
-Através do estudo cuidadoso das performances mais competentes.
           No terreno da prática profissional, a ciência aplicada e a técnica baseada na pesquisa ocupam um território criticamente importante, ainda que limitado, que faz fronteira em muitos lados com o talento artístico.
          Há uma arte da sistematização de problemas, uma arte da implementação e uma arte da improvisação- todas necessárias para mediar o uso, na prática, da ciência aplicada e da técnica.            
              O QUE ESTÁ POR VIR
                    Schön explorou um pouco das tradições desviantes da educação para o talento artístico e desenvolveu, a partir delas, uma visão geral a que chamou de ”ensino prático reflexivo”- um ensino prático voltado para ajudar os estudantes a adquirirem os tipos de talento artístico essenciais para a competência em zonas indeterminadas da prática. Argumentou que as escolas profissionais devem repensar tanto a epistemologia da prática quanto os pressupostos pedagógicos sobre os quais seus currículos estão baseados e devem adaptar suas instituições para acomodar o ensino prático reflexivo como um elemento-chave da educação profissional. A parte dois da obra de Schön foi dedicada exclusivamente ao ateliê de projetos, o que não é objeto deste estudo.       
              O PROFISSIONAL REFLEXIVO SEGUNDO SCHON:
                  Todos nós refletimos na ação e sobre a ação, e nem por isso nos tornamos profissionais reflexivos. É preciso estabelece a distinção entre a postura reflexiva do profissional e a reflexão episódica de todos nós sobre o que fazemos. (Perrenoud 2002).

                       Visando chegar a uma verdadeira prática reflexiva, essa postura deve se tornar quase permanente, inserir-se em uma relação analítica com a ação, a qual se torna relativamente independente dos obstáculos encontrados ou das decepções. Uma prática reflexiva pressupõe uma postura, de forma de identidade, um habitus. Sua realidade não é medida por discursos ou por intenções, mas pelo lugar, pela natureza e pelas consequências da reflexão no exercício cotidiano da profissão, seja e situação de crise ou de fracasso seja em velocidade.
               De certa forma, ele revitalizou e conceituou mais explicitamente a figura do profissional reflexivo ao propor mais uma epistemologia da prática, da reflexão e do conhecimento na ação. Mais de 20 anos depois de seus primeiros trabalhos em parceria com (Argyris (Argyris e Schön, 1978) , a idéia deixou de ser nova e tem inspirado inúmeros estudos e procedimentos de formação tanto nos países anglo-saxões, quanto em outros lugares.
           Mas aí dizer que demos uma volta completa em torno do paradigma reflexivo e retornamos a ele implicaria a aceitação de que há apenas um passo que alguns poderiam se sentir tentados a dar, sobretudo no mundo de língua francesa, que atualmente parece fascinado por outras palavras-chave: bases de conhecimento, especialidade, metacognição, análise das práticas e do trabalho, ação comunicacional, desenvolvimento de competências.
           Parece que nenhuma delas invalida a idéia de profissional reflexivo como paradigma integrador e aberto
      CONCLUSÃO:
                     Schön afirma que a reflexão implica a imersão consciente do homem no mundo da sua experiência, permeada por um contexto sócio-cultural. Ao refletir dentro das próprias relações sociais- interferência na prática e sua modificação- e por outro lado- refletir a prática e praticar a reflexão - e através dessa dinâmica permitir a construção de um novo saber. Portanto, a prática não é só do objeto da reflexão, é também objeto de ressignificação. Nesse sentido, essa reflexão é condicionada a um determinado tempo e suas representações, na qual está inserida. É claro, diante da análise, percebe-se a dificuldade da efetivação da reflexão que se pretendeu fazer neste estudo.

      Referências Bibliográficas:

      Schön, Donald A. Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o Ensino e a Aprendizagem, Artmed. Porto alegre, 2002.
      Perrenoud Philippe, A Prática Reflexiva no Ofício de Professor Profissionalização e Razão Pedagógica. Artmed, Porto Alegre,2002.
 

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